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Quem ganha R$ 666 no Brasil não é pobre. O que dá para comprar com isso no mês?  

Quem sobrevive um mês com mais de R$ 666 não é pobre no Brasil.  

De acordo com os cálculos do Banco Mundial e do governo brasileiro, que adota a mesma referência, famílias cuja renda per capita é maior que R$ 665 estão acima da linha da pobreza.

Mas o que uma família no Brasil consegue pagar com esse orçamento?  

Nós fizemos as contas. Conclusão: dá para sobreviver, desde que se viva em um imóvel pequeno na periferia e que não haja despesas com imprevistos ou com poupança, e a alimentação seja muito básica.

Lazer e cultura ficam fora da lista. Até mesmo pagar internet e serviços de streaming para ver um filme não tem como incluir do gasto mensal. Mesmo estando acima da linha da pobreza oficial, essa família estaria muito longe do que se convencionou chamar de classe média.

A renda per capita é o valor médio de renda por pessoa da família. Para viver fora da linha da pobreza, considerando uma família com pai, que trabalha como porteiro no centro de São Paulo e é casado, com dois filhos. O valor total do orçamento dessa casa, com base na linha da pobreza do Banco Mundial seria de R$ 2.664. 

Como a orientação de economistas é que o aluguel não deva comprometer mais do que 30% da renda, o custo para moradia dessa família pode ser de até R$ 799. 

Nesse valor, o Zap Imóveis, uma das maiores plataformas de anúncios do país, tem poucas opções na maior cidade do país.  

O site oferece um apartamento de dois quartos com 55 metros quadrados em Jardim Brasil Novo, no valor de R$ 780. O imóvel está localizado em Vila Medeiros, zona norte, próximo à região de Guarulhos. Para efeito de comparação, leva-se cerca de 1h15 de transporte público de lá até o centro de São Paulo. 

Para um imóvel em melhores condições, talvez seja preciso ir um pouco mais longe, pelas bandas de Interlagos. Das poucas opções que existem, uma delas é de dois quartos por R$ 700, na Chácara Santa Maria, na Zona Sul — o que exige em torno de 1h40 de deslocamento até o centro da cidade usando metrô e ônibus.

O anúncio explica que o valor da locação pode subir um pouco — “até 900, pois a vaga de garagem possui o valor adicional de R$ 100” (imagina-se que sejam duas vagas disponíveis).

Todo o resto 

Pago o aluguel de R$ 780, sobram R$ 1.884 para as despesas de luz, água, internet/telefone, gás, transporte, vestuário e alimentação de quatro pessoas durante 30 ou 31 dias (salvo fevereiro). 

O governo tem um programa que isenta famílias com renda familiar per capita de até meio salário mínimo e que utilizem até 80 kWh por mês. A família cuja renda per capita é de até R$ 665 é elegível para a Tarifa Social de Energia Elétrica (TSEE), pois a metade do salário mínimo hoje no Brasil é R$ 759.  

Contudo, o consumo médio mensal de luz nas residências brasileiras é de 152,2 kWh/mês, segundo pesquisa do Laboratório de Eficiência Energética em Edificações (LabEEE) da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). Nesse caso, a família teria que pagar a diferença do que consumir acima de 80 kWh por mês, o que ficaria em torno de R$ 60 (150 kWh) a R$ 80 (200 kWh).

Fachada de um imóvel que quem não é pobre consegue alugar em São Paulo (Foto: Google Maps)

Já o botijão de gás custa, em média, R$ 110 em São Paulo, segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). A compra vai depender da frequência com que a família usa o fogão para as refeições. Se fizer café, almoço e janta para quatro pessoas (talvez o pai da família leve marmita), por exemplo, o gás dura cerca de um mês. Se o preparo dos alimentos for dividido com outros aparelhos, como fritadeira elétrica e micro-ondas, é provável que dure uns dois meses. 

De acordo com fontes como a Agência Reguladora AGER e estudos de saneamento, uma pessoa consome em média 110 a 200 litros de água por dia. Para uma família de quatro pessoas, isso equivale a 440 a 800 litros por dia. O valor depende da região e da rotina das pessoas, mas, em média, significa entre R$ 80 e R$ 150 no mês, incluindo taxa básica operacional para água e esgoto. 

R$ 792 para passar o mês 

Para efeito de comparação, vamos considerar os valores mais baixos das médias das despesas básicas de casa: R$ 60 de água, R$ 110 de gás e R$ 80 de luz. O montante, somado ao aluguel, deixa disponível R$ 1.634 para essa família gastar com alimentação, remédios, transporte, lazer, vestuário, educação etc. 

Até agora, a família já gastou R$1.030 reais e ainda nem comprou o mais importante: o alimento.   

Para a comida, a referência é a cesta básica usada pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). A instituição pesquisa mensalmente o custo de 13 alimentos essenciais em 17 capitais brasileiras, incluindo São Paulo. O conjunto de alimentos essenciais para o sustento de uma pessoa adulta no mês inclui: arroz, feijão, café, açúcar, óleo, leite, manteiga, carne, pão, batata, tomate, farinha e banana. 

Em setembro, o salário mínimo necessário para a manutenção de uma família de quatro pessoas deveria ter sido de R$ 7.075,83 ou 4,66 vezes o mínimo reajustado em R$ 1.518, segundo o Dieese.

O valor médio da cesta básica na capital paulista é de R$ 842,26 — a mais cara entre as capitais pesquisadas. O percentual do orçamento é destinado para comida depende de cada família, da rotina, da frequência e das idades.

As despesas com aluguel, as contas básicas da casa e uma cesta básica média consumem a maior parte da renda. Sobram R$ 792. É com esse valor que a família terá de comprar carne, remédios, produtos de higiene pessoal e limpeza, fazer a feira e outros itens.

Exemplo de gasto em mercado 

Se a família não gastar essa média de R$ 842,26 na cesta básica, montamos uma possível opção (dentro das preferências e diferenças) no site do supermercado Extra, em São Paulo. Uma cesta básica com 30 itens sai por R$ 275,31 (no Pix).

Dos 13 itens sugeridos pelo Dieese, estão inclusos: arroz (3 kg), feijão (1 kg), café (250 g), açúcar (1 kg), óleo (900 ml) e farinha (1 kg). Inclui outros, como uma latinha de sardinha, um pacote de biscoito cream cracker, um creme dental, dois molhos de tomate, farofa, fubá e três pacotes de mistura para fazer refresco. 

Se considerarmos duas dessas cestas de R$ 275,31 para alimentar quatro pessoas, ainda faltam itens da lista básica para um adulto viver bem em um mês. O litro do leite em São Paulo está, em média, acima de R$ 5 (no Extra). Por uma promoção de R$ 4,49, dá para pegar quatro. Se um dos moradores for intolerante à lactose ou criança, fica mais caro. O leite especial é mais de R$ 8 e o dos bebês, quase R$ 30 a lata com 380 gramas. 

Dá para fazer algumas substituições. Sai a manteiga e entra o pote de margarina de 500 gramas por R$ 7,39 e, no lugar da carne, quatro quilos de pé de frango (R$ 17,96) e quatro de coxa de frango (R$ 19,08), três bandejas com 20 ovos cada (R$ 32,70), um quilo de tomate (R$ 6,95/kg), um de banana (R$ 4,89/kg) e um de pão (R$ 16,80/kg). O total desses extras para compor a cesta básica sai por volta de R$ 123,43. 

Cesta básica com 30 itens, entre eles, arroz, feijão, óleo, farinha, macarrão e molho de tomate (Foto: Captura de tela do site Extra)

As feiras ao ar livre e os dias de promoção dos mercados são boas alternativas para comprar os demais alimentos. Os descontos podem variar de 10% a 40%. As frutas e legumes sazonais também costumam ser mais baratas. 

Daqueles R$ 792 que tinham sobrado do aluguel, das contas e do valor médio da cesta básica e dos demais itens que o Dieese sugere, restam: R$ 668,57. Uma compra para produtos (dos mais baratos) de higiene pessoal (sabonete, absorvente, papel higiênico, shampoo) dá em torno de R$ 117,95 para quatro adultos. Se for criança ou bebê, custará mais. 

Vale ressaltar que as compras de supermercado calculadas acima não incluem alimentos não essenciais, mas bastante comuns às mesas dos brasileiros, especialmente daquelas que têm crianças e adolescentes, como refrigerantes, queijo, salgadinhos, biscoitos, doces e iogurte. 

Remédio, transporte, limpeza 

Sobrariam R$ 550,62 para comprar estes itens, além de produtos na farmácia, transporte, internet, material escolar, roupas, produtos de limpeza e lazer.  

O sonho de um carro seria inviável. Um Gol 2010 sai por aproximadamente R$ 20 mil em São Paulo. Isso é mais da metade da renda anual da família. 

A tarifa do Bilhete Único de São Paulo é R$ 4,40 por viagem, com integração gratuita entre ônibus e metrô/CPTM por até 3 horas. Para cada membro da família que use transporte público diariamente, é um custo em torno de R$ 193 por mês (considerando ida e volta de 22 dias úteis, em média). 

Se ao menos um fizer uso do Bilhete Único, o orçamento familiar mensal cai de R$ 550,62 para R$ 357,62. Ou seja, se fosse dividir esse valor por cabeça (per capita), cada um teria R$ 89,40 para passar um mês inteiro, além de comida, higiene e moradia.

Sobrevivência extrema 

O professor de economia aplicada da FGV/Ibre Daniel Duque explica que o valor de R$ 655 por pessoa por família é uma média bastante genérica, pois o Banco Mundial usa muitos e diferentes países na conta. “A linha de pobreza é arbitrária. Há formas mais objetivas de mensurar, mas o banco faz uma grande média de rendas de países e de situações.” 

O corte da linha da pobreza, explica ele, não considera se a pessoa vive bem, mas se está sujeita às privações básicas, como alimentação, acesso à água e moradia. Ou seja, o mínimo de sobrevivência. “Não é uma linha de bem-estar, é de passar por privações relevantes.”

No mês passado, o governo divulgou que 6,55 milhões de famílias deixaram a linha da pobreza nos últimos dois anos — o que representa 14,17 milhões de pessoas. Segundo a Agência Brasil, isso foi feito com uma análise de famílias inscritas no CadÚnico que usa como referência uma renda per capita ainda menor que a do Banco Mundial. 

O CadÚnico usa como linha de corte o valor de R$ 218 por pessoa por família para conceder benefícios como tarifa social de água e luz, acesso a sacolões de alimentos e de higiene. 

Duque observa que parte da “saída da pobreza” vem do Bolsa Família e de auxílios. Se por um lado a iniciativa ajuda milhares de pessoas, o efeito rebote para o país pode ser devastador, a exemplo do que aconteceu na década passada, na gestão da ex-presidente Dilma Rousseff. Após um período em que os números mostravam crescimento, a conta chegou e o país enfrentou uma grave crise econômica nos anos seguintes.

“De três anos para cá, o mercado de trabalho melhorou e a renda aumentou, não só pelo Bolsa Família e pelos auxílios. Não surpreende que a pobreza esteja caindo. Se ocorrer crise fiscal e houver redução dos benefícios do Bolsa Família, haverá uma reversão. A questão é quão sustentável é esse processo e se o governo vai conseguir controlar as contas públicas”, diz Duque.

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